segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Solitude

Lanças de ócio trespassam as paredes,
o vento contra a janela compõe uma sublime melodia
desliza, garrafa abaixo, a ultima gota de vinho
Uma cadeira para a solidão...

Tenho a companhia de móveis, tinteiro e uma pena
lanço-me de encontro ao espólio criativo
vez ou outra, breves versos me visitam
Duas cadeiras para a amizade...

Recuso-me a estupidez das multidões
insetos zunindo angustias do cotidiano
ações levemente programadas ocultam o marasmo
Três cadeiras para a sociedade...

Vladmir Fergursson

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Descompasso

Maqueie-se, minha querida
pinte seus lábios frios de carmin
mascare seu rosto pálido de rouge
e entupa os poros de sua pele
com pó das cinza que restaram.

Vista seu melhor vestido longo
seu traje de gala, roto e gasto
o vestido negro de todo velório.
Use suas melhores jóias, falsas.

Venha me levar, deste louco baile
de pernas tortas em descompasso
em saltos altos, a desvarios e desiluões.
Te conduzo a esta ultima contra-dança
Valsa de violinos vorazes, desfinados

De três em três compassos
a existência segue seu fardo.
infância, juventude, velhice
se esvai a vida em cada passo.


Franco Saldaña.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

O Fim

Era inevitável, segurava o papel com a sentença do já esperado momento.

Não sabia onde olhar, o que pensar...seu rosto sentia o suor frio de sua mão aflita.

Lagrimas não brotavam, elas se afogaram na amargura estomacal que pulsava com um frio estonteante. Procurava olhares alheios...ela tinha os olhos vermelhos e rosto encharcado, ele atônito e duro como o mármore, o outro fugia de seu olhar como quem foge desesperadamente da gigantesca criatura negra de proporções aniquiladoras.

Sua mão tremia junto com seus pensamentos, eles percorriam o passado, e cada momento bom foi findado numa felicidade penosa e passageira.

Compreendeu que seus instantes do passado eram e foram sonhos...quis correr, gritar, abraçar a todos...tudo se resumia em uma dentada desesperada em seus lábios...como se mordesse sua existência com todas as forças que sua vontade reunia.

Olhou para cima, e abaixou novamente a cabeça, uma lagrima tingiu de transparente o papel que confirmava com ciência a finitude que fora sempre ignorada pelo inebriante sabor dos sentidos, dos caminhos percorridos.

Era o fim...e era para sempre.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Cima da linha

Vamos transformar os sonhos em fatos

Esquecer que mais cedo ou tarde ainda sonharemos

Não posso me encher de insipidez

Mas me conceber com possibilidades

Acolher como quem colhe

E me deixar levar como quem flui

Levando cerejas aos pares

Navegando os mares

Levando o que fui

As conseqüências do que serei

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Mais um Dia de Trabalho

O horário de almoço mal chegara e Miguel já deveria ter olhado para o relógio de seu escritório inúmeras vezes, trabalhar em uma cidade vizinha era muito cansativo, acordava religiosamente todos os dias antes das seis horas, só assim conseguia passar seu café e ler as principais notícias do jornal enquanto travava épicas batalhas entre sua mente e o ponteiro dos segundos de seu relógio analógico. Todavia o salário era bem melhor que qualquer outro emprego que poderia encontrar em sua cidadezinha de cinco mil habitantes, só não mudara ainda para a cidade de seu trabalho porque tinha algumas responsabilidades emocionais com sua mãe que era viúva a menos de três anos, a coitada da velha mal conseguia digerir a idéia de morar em outra cidade que não fosse a que tinha passado os melhores momentos com seu amado, sentimento que misturava amor, angústia e desespero até certo ponto, sua mãe acordava todos os dias antes mesmo de ele acordar e passava horas e horas a rezar seus terços em homenagem ao defunto, após a dedicação espiritual alheia caminhava, as manhãzinhas relembrando os principais locais de seu relacionamento que se foi, como numa necrolatria sem fim.

Não era um dia muito movimentado em seu trabalho, e além do mais ele já tinha adiantado todo o trabalho da semana na segunda e terça, porém também não podia descansar, pois seu patrão aparecia em espaços de vinte e trinta minutos na porta de seu escritório, como um cão de guarda farejando e fiscalizando algum mau investimento salarial que poderia ser cortado e substituído por algum outro, e o melhor de tudo com no mínimo trinta por cento a menos de salário nos três primeiros meses. Quinze minutos para o fim de seu expediente, já conseguia sonhar acordado com sua cama que estava a dois quarteirões de seu trabalho mais algumas horas pacientemente sentado até o ônibus chegar em sua cidade, quando num surto de tarefas do cotidiano se lembrara que hoje era dia da missa de celebração póstumas pela morte de seu pai, não entendia porque sua mãe marcara essas missas a cada quinze dias, já até pensaram em pagar um psiquiatra para a velha, essa preocupação pós morte já estava ficando doentia, porém o catecismo havia lhe educado bem e tinha consciência de sua postura espiritual, além de guardar domingos e feriados Miguel participara de quase todas as iniciativas religiosas de sua mãe, afinal de contas “a caridade bem ordenada começa por nós mesmos”.

“Graças a Deus, estou há caminho de casa”, pensara Miguel enquanto entusiasmado escolhia algum dos poucos assentos que restara do lado da janela, era só o ônibus sair da cidade que já começava a lutar contra suas pálpebras para não cair no sono, esse cochilo poderia atrapalhar seu relógio biológico e fazer-lo se atrasar para passar o café do dia seguinte, mas hoje foi um dia diferente, Miguel mal esperava pela missa, não por sua espiritualidade aflorada, mas pelo fato de Ana – uma moça que foi sua namorada até o final do ensino médio – sempre ir à missa as quintas-feiras, se ao mínimo ela soubesse quantas vezes Miguel reconstruía o diálogo que possivelmente iria iniciar ao encontrá-la. Foi em uma das curvas que, enquanto Miguel pensara se era melhor pronunciar Ana ou querida, o motorista se deparou com um carro que estava vindo contra o seu sentido, na mesma pista, Miguel não entenderia quase nada, apenas sentiu um grande frio na barriga, seguido de um grande impacto – seu corpo estilhaçando o vidro da frente do ônibus, resultado da freada brusca – e uma luz serene e límpida lhe enchia o coração de paz, era o seu fim e Deus enviaria seus anjos para lhe conduzir em direção ao paraíso, ou apenas o farol do ônibus seguido das rodas desgovernadas que, espalharam seus miolos por alguns metros do asfalto.



Samuel Bradinsky

terça-feira, 21 de setembro de 2010

O Teimoso jovem velho

Havia de imediato uma vontade subida de corrigir e comprimir todos os erros do passado em uma pequena caixa e dizer para si mesmo :”Finalmente findei minhas dividas para com minha consciência!”

Listou e fez de sua consciência ferida, o mapa para chegar a uma redenção cega e plena de cansaço, e como troco, gerar dividendos para com o tempo.

Já o tempo, fora, restava as passagens caóticas em mente e a vontade de remediar... a tarefa é digna de honrarias...mas com entranhas permeadas de vergonha.

Como chorar? E para que chorar? O consolo dele não passava de apoio para si mesmo e uma maneira de sorrir sem fios de culpa...

Ao olhar nos olhos, caia em lamentações, que por mais românticas que pareciam, careciam dessa dor...mesmo sem forças mantinha-se firme,era necessária tal agonia?

Para que? Onde chegara com isso? E se chegar? Chegara pelo menos a metade de seu ser? Estará disposto a deixar tudo para trás?

Se sim...ai esta sua sina...sangrar em seus textos até sanar as mazelas de sua maturidade vagabunda e senil...

domingo, 29 de agosto de 2010

Fractal

Enterra-se em sí só
cava-te em tua cova
e vela seu funeral
a cada dia, passado

a poeira do tempo
escama de seu corpo

em células mortas
a vida se esfarela

Enterra-se em sí só
prenda a respiração
e mergulhe fundo
no fractal que te faz

a cada célula que se regenera
na molécula que se funde

em poros e aspirações
de átomos se refaz a vida

Enterra-se em sí, e só
aceite a morte fatídica
então e só, então, saberá
que existir não é o sentido

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Quiçá

Aos passos que meus olhos compreendem a individualizada evolução dos homens
sinto um leve asco pairar sobre meu estômago
Quiçá seja a sutil verossimilhança entre a hipnopédia dos romances de Huxley
e as propagandas com seu beharviorismo tênue, promovidas pelo olho absorvente: TV
ambos tão enredados que,
me vêm a mente a transcendência do superorgânico ao primata domesticado

Quiçá esteja cometendo um grande crime praticando o duplipensar
mas que culpa tenho eu, se minha ânsia e essência se fundem ao caos?
se mesmo em minhas mais sublimes meditações, contemplando uma margem de rio
consigo perceber fractais que se recriam sempre que a areia é movida...
Quiçá até minha essência seja uma arma psicológica da policia do pensamento
quando abrem espaço para a mesma se identificar mediante a ética e a moral

Que somente a dúvida acalentaria a razão humana!
e que os homens se tornem cada vez mais cães dóceis
que se contentam com uma cama que os protegem do frio da madrugada
suas tigelas de ração diárias e seus ossos ultra-tecnológicos
Quiçá a liberdade seja um mero esboço...


Emmanuel Goldstein

sábado, 3 de julho de 2010

Masoquismo

Deixe-me provar teu do medo
do trauma, da auto-tortura
psicológica, fisiológica.

Deixe me sentir a humilhação,
o remorso da culpa que corrói,
o arder do tapa na cara merecido

O impacto bruto de um punho
um soco no meio da fuça, a realidade.
O amargo da vida que me escorre da boca
do sangue quente e pulsante.

Deixe-me só, deixe-me sentir
a ferida aberta que não estanca
o hematoma imundo a inflamar,
o pus podre que fede a cadáver

Os medos que me fazem covarde.
Os traumas que me fazem humano.

Da dor depois da surra
que me faz sentir vivo.


Franco Saldaña.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

O que é isto, a racionalidade?

Quando os sentidos estão cansados de formas retilíneas de formalizar o pensar
Já não me basta a razão em meio desse coagulo de fractais infinitos
Que espera ser dos padrões uma necessidade de libertar os instintos?
Para a corja de adoradores da santíssima razão
Me apego ao acaso, e este é um de meus maiores amigos
Quiçá na busca de proclamar algum Deus, seria o acaso o mais exuberante
Não preciso de linhas mirabolantementes re-pensadas que se confundem em sua ânsia silogística
Me contento com uma vara de pesca,
Assim consigo fisgar as palavras que me apetecem




Samuel Bradinsky

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Hiperglicemia

Come chocolates, pequena, come chocolates!
Entupa os poros de sua pele de gordura
hidrogenada, flavourizada, transgênica

Ah querida, tuas palavras são tão doces
e de tão doces enjoativas, diabéticas
de um doce amargo como aspartame
destes que impregnam o palato
que ficam a azedar, apodrecer
até o esturpor da náusea, do vômito

E dizes-me que é a unica forma de adocicar a vida
de sedar os sentidos, ludibriar o paladar

Mas de nada adianta sua doçura tão artificial
se usada para temperar alguém tão insípido
uma existência sem sabor de vida.


Franco Saldaña.

domingo, 7 de março de 2010

Política dos Ratos

E jogam os ratos
esgueirando-se pelos cantos
procurando um novo smoking
narizes vorazes, à destituir algum queijo
passos leves, na sede de um novo bando
refugiam-se dentre fogões geladeiras ou pias entupidas

E jogam os ratos
pesquisando algum novo/velho discurso fascista
sem contar os que se disfarçam de bolchevistas
sempre alertas há um possível predador
que diga-se de passagem vindo de sua própria classe dominante
dominada, mal tratada, bem vestida, bem engolida, bem farsante
sempre há tempo de clamar um velho favor!!

E jogam os ratos
espreitando a ratoeira, enquanto decidem o infeliz que morrerá pela causa
clap! Lá se foi mais uma cabeça
também não encontraram mais o queijo



Samuel Bradinsky

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Automatização Coletiva

Talvez um dia a palavra já não sirva
Afogada em sistemas inertes
já podres dentro de uma consciência coletiva
mas mesmo assim
continuarão existindo aqueles que Sonham
O lagarto não os pegará
você não será pego



Suzein Krieger

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Sanatório, Parte 1 - O Diário

Já faz treze dias desde que me enfiaram nesse buraco escroto e o ápice de todas as minhas incertezas até este momento é que sequer ao mínimo informaram sobre minhas condições patológicas. Bipolaridade ou depressão?... se bem que isso já deixou-me de ser uma preocupação, tendo em vista que nesse boeiro imundo a última coisa que atribuem valia seria no caso a sanidade, como minha consciência ficaria grata caso meu esteriótipo de "louco comedor de merda" fosse apenas uma pequena partícula de realidade nesse asilo. No dia em que eo fora despejado neste antro já ocorriam histórias de que dois dias antes da minha vinda um dos internados teria ateado fogo em algum infeliz dentro da ala C, e o pior de tudo é que ainda por vezes consigo sentir o cheiro de carne queimada quando alomoço, a única coisa que ainda tenho ânimo para fazer diante de tanta podridão é tentar manter minha mente limpa... ao máximo, e receber alta por bom comportamento ou qualquer brecha similar, só espero não me tornar semelhante a internada do 37B, que todas as manhãs arruma suas malas e se dispede de metade do asilo, alegando ter recebido alta. se ao menos eu tivesse a mísera felicidade do acaso me presentear com alguma existência sóbria, sã, em plena consciência de sí, para um diálogo... nem que seja palavras jogadas ao vento, quisera eu, as enfermeiras serem um tanto quanto mais compreensivas e que não somente tenham como intenção me ludibriar com seus medíocres discursos que se resumem em meu trabalho é apenas ter a certeza de que os medicamentos receitados desçam goela abaixo, nem as faxineiras se arriscam mais à limpar os quartos na presença de algum internado após o último incidente no qual os retardados mentais da ala F molestaram sexualmente uma de suas companheiras com o auxílio de uma faca.

O tempo parece não existir entre essas paredes, nenhuma medida a ser tomada como margem, nenhuma distração oferecida aos meus olhos para que os passos do tempo se acelerem, acaso não fosse os banhos de sol regulares, sinceramente não sei o que seria de minha percepção temporal, se bem que já fazem dias que me recuso a sair para além daquela fria e rígida maçaneta, prefiro a serenidade de meu quarto individual, com minha cama, minha cômoda e minhas paredes, tudo com um nível de branquitude ímpar, tão confortante e ensurdessedor. E pensar que ainda tentei, na primeira semana perambular pelos corredores à conversar com os internos na esperança de encontrar algum fragmento razão escondida querendo se expor, minha ânsia fora tão avassaladora que até cheguei a participar das atividades coletivas diárias, o mais estranho foi que quanto mais me aproximava dos internos, mais sentia a insanidade penetrar em minha pele, se alojar em meus poros, passar pelas minha papilas gustativas, vez ou outra até se misturará com o odor de carne queimada. Se existe um paraíso nesta desprezível colônia de férias sem sombra de dúvidas é meu quarto, isto quando algum demônio não vem roubar minhas maçãs através dos gritos abafados de algum paciente incontrolado que foi convidado a repousar por algumas horas, ou dias no quarto acolchoado.

E pensar que meus planos, em contraste com minhas atuais circunstâncias se resumem num profundo mergulho dentro de mim, já não me iludo nem com espectativas, volta e meia me encontro numa cama e o pouco que me resta dos sonhos, não me lembro mais, quisera que meu instante seja hoje algo mais que uma lacuna.




23 de Maio


João Augusto de Oliveira

domingo, 10 de janeiro de 2010

Pensar mecânico

Na rotineira ação de tomar o bonde toda manhã, acendo um cigarro por prazer solitário. Após uma longa tragada, a nicotina se instala em meus pulmões fazendo as engrenagens de minha mente girarem. A fumaça flutua em espirais pelo ar fundindo-se com meus pensamentos absortos.

Vejo o sopro de minha vida se esvair pelos meus pulmões junto da fumaça exalada. Quanto tempo de minha existência um cigarro pode me tragar? Horas, dias, meses, não sei ao certo. Quanto desse tempo vale o breve prazer de uma tragada? Com certeza mais que o tempo perdido esperando a condução. De que vale viver, carregar no dorso tantos traumas e decepções, porém resistir a tentação de desfrutar dos mínimos prazeres e alívios terrenos como uma trago de viver que bebo em uma tragada de tabaco? A morte chega, sim, carregada pelo remorso que rói os ossos. Chega tão certa quanto o ultimo trago do cigarro.

Corro os olhos ao pulso, procurando as horas. Os ponteiros petrificados. As horas dissipam-se pelo ar junto da fumaça. Perdi minha vida nas horas de trabalho não pagas pela mais-valia. A vida se perdeu pelas vielas das horas. Perdi o bonde. O tempo não existe, nunca existiu. São apenas números, medida estipulada pela espupidez megalomaníaca humana de possuir o controle sobre do imprevisível.

Enfim chega o coletivo, entupido de corpos moribundos. Magnetizado, me acoplo ao automovel como todas as peças alí presentes, que no desgaste do atrito de suas existêntias, cinéticamente são fadadas a fazer funcionar a grande máquina que as comanda.


George Samsa.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Caminhante Noturno

Estara sentado há alguns bons minutos, com o cigarro entre os dedos, tragadas fortes poderiam medir a fluência na qual sua mente trabalhara. Seus olhos sem foco... sem brilho, seu verdadeiro intuito era enxergar(projetar-se) dentro de si. Nas reminiscências de sua alma, encontra-se com o abstrato divinizado do eu e um pequeno ruído que instantes depois tornar-se-ia um estampido desconcentrante, "duas da manhã e meu único momento realmente só é interrompido por um idiota motorizado", é difícil olhar dentro de si quando parte do ambiente lhe cobra os olhos, ou ouvidos. Tentou por mais algum tempo arremessar-se novamente em sua consciência, fracassando obviamente, é difícil retomar o foco quando a distração lhe abre margem para outras distrações que re-aparecem em cena.
Pos-se então a andar, não apenas para encontrar seu abrigo, no fundo de sua alma suas pernas se moviam para o acaso, sua vida não andara lhe caindo muito bem, como um copo de whiskey que sucede a embriaguez, a cada instante seus olhos buscavam algo em sua caminhada noturna, quiçá seria a particularidade de iluminação do caminho percorrido ou a arquitetura do bairro visitado, quisera, por infelicidade de nosso observado, seus olhos estarem sedentos de si e seus ouvidos procurando algo como a estonteante sinfonia de seus batimentos cardíacos.
Passos e mais passos fizeram-o encontrar seu novo templo, uma pequena praça escondida das luzes ofuscantes de Marseille, a noite é mais que sublime, o sol apesar de nos acariciar com o calor e a segurança visual, também nos condena ao esconder com seu brilho a magnitude e exuberância de outros incontáveis astros em potencial. Sua cabeça exalara pensamentos, alguns pingavam pelos fios de cabelo, era hora de outro cigarro acesso enquanto contemplara as estrelas. Doce ilusão de nosso aventureiro solitário, não era nem sua terceira tragada quando percebera que os brilhos da abóboda celeste que fizera-o cessar sua caminhada noturna eram rápidos demais para ser astros e ao mesmo tempo lentos demais para cadências, "malditos projéteis voadores, maldita luminosidade em demasia, acaso não fosse esta escória de supra-engenheiros medíocres que produzem esses infames e fúteis anexos tecnológicos", pensara consigo. Era hora de descansar seu corpo pesado, recolher suas pupilas cansadas e sua alma sedenta de sonhos, pois a lucidez lhe condenará numa prisão de plástico e vidro.



Vladmir Fergursson